Com a redefinição do trabalho surge a redefinição das funções. O torneiro mecânico de hoje não é mais como o do passado, perito na prática dos cálculos cujo lápis, papel e paquímetro eram imprescindíveis auxiliares. Atualmente o torno é computadorizado dispensando tais ferramentas.O pedreiro de hoje, por exemplo, pode recorrer à betoneira e ainda existe o concreto usinado que já chega pronto à construção, entre outros inúmeros avanços tecnológicos da construção civil. Ganha-se tempo e poupam-se esforços físicos. O arquiteto, tanto como o projetista, o desenhista e demais profissionais de áreas semelhantes, parece que a cada dia vislumbram as réguas e os compassos como objetos de um passado longínquo, peças de antigüidade a serem contempladas num museu histórico. A popular parteira tornou-se a obstetra que possui nível superior e em muitos casos especialização. É o profissional que traz pessoas ao mundo. E quem diria, peões em obras rodoviárias cedem lugar aos bonecos com suas bandeirinhas e inscrições: “Cuidado! Obras na pista.” Outrora alguns fiscais de trânsito já tiveram destino semelhante na capital paulista.
Assim são algumas das transformações no mundo do trabalho com a criação de novos profissionais e as redefinições de funções; extinção de umas e criação de outras. O desenvolvimento social parece que nunca acelerou tão vorazmente como agora. A necessidade de qualificação para o trabalho é assustadora. E haja cursos de reciclagem!Diante desse panorama, a tradicional figura do professor - quase que imutável - aquela que parecia transcender os tempos, as regiões, culturas e nacionalidades, também sofre uma significativa mutação ou uma adequação às novas necessidades impostas pela modernidade e o desenvolvimento humano.
Eis que surge a função a qual deveria ser exercida, exclusivamente, pelo “professor carcereiro”. Agora só falta criar o profissional. Sua principal tarefa e, por conseguinte, função: conter o aluno em sala de aula. Essa função, mesmo desapercebida por muitos, parece que já vem de longe nas escolas de nosso país, sobretudo nas públicas. Mesmo não reconhecida e regulamentada, é exercida cotidianamente, hora a hora, minuto a minuto, aluno a aluno, sala a sala, escola a escola. A realidade exige um profissional especializado para tal função. Os cursos de formação ainda não se preparam diante da nova demanda. Mas a clientela precisa. A legislação também é omissa diante desta quase inusitada realidade.
Direções de escolas improvisam métodos de “cárceres pedagógicos” por conta própria, mas quase sempre sem efeito prático. De cadeiras e mesas nas portas das “celas” de aula impedindo a passagem até “conselhos” aos professores no intuito de manter não só os alunos em sala, mas também a ordem e a disciplina. A nova função exige que o atual profissional (ainda não qualificado para tal) desenvolva habilidades mirabolantes para não dizer sobre-humanas. É um pontinho aqui, um negativo ali, um silêncio premiado acolá, um gritinho, uma ameaça, um berro, um olhar... Há de se manter o aluno em sala a qualquer custo. As estatísticas ordenam. Ensinar não é o mais importante.Solicitar a presença do inspetor de aluno diante da indisciplina já não “cola” e punições viram-se contra o próprio profissional da educação. Há o caso do professor que depois de insistentemente pedir silêncio, numa situação limite, avisou ao aluno que solicitaria a sua saída de sala caso prosseguisse o distúrbio. Dito e feio, o aluno ignorou por completo a autoridade do professor. Este solicitou ajuda ao servente que também foi ignorado pelo jovem. O último recurso do mestre (que não se qualificou para ser um professor carcereiro) foi ameaçar: “ou eu, ou você saí”. E o aluno continuou em sala a desafiar e tumultuar, mesmo com os protestos dos colegas de classe. O professor, que já havia iniciado as atividades em sala, prontamente se retirou. Não bastando o afronto do discente, o mestre também fora golpeado pela direção da escola, pois que se sabe, até hoje, nada aconteceu ao aluno transgressor e o professor sofreu falta como se simplesmente não estivesse comparecido à escola.
Antes fosse assim, pois não teria sofrido tamanha humilhação. Outras tantas situações ilustrariam esta nova função, como por exemplo, a responsabilidade do docente em trancar e destrancar com as suas próprias chaves as “celas” de aula em períodos de intervalo a fim de evitar o furto do precioso e vilipendiado material escolar. Mas não estenderei os exemplos e as tentativas de definições desta nova função que necessita de maior atenção dos órgãos e autoridades competentes. Sou apenas um profissional da ciência histórica em busca de novos e melhores horizontes.Entretanto, fica um alerta para esta nova realidade com a ausência completa de regulamentação, preparação e capacitação desse novo tipo de profissional, parece que tão necessário quanto o giz e a lousa: o professor carcereiro.
Autor: Marcelo Botosso Bacharel, licenciado, mestre, doutorando em História e (pasmem!) professor, marcelo_botosso@yahoo.com.br
quarta-feira, 28 de maio de 2008
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